terça-feira, 10 de julho de 2012

Golpistas paraguaios criaram problemas na integração da América Latina


O golpe contra o governo de Fernando Lugo no Paraguai, a nova derrota das forças progressistas no México e os acontecimentos recentes no Peru e na Bolívia indicam focos de tensão no continente. Mas, não são os únicos. Os acontecimentos no Paraguai, seguido da incorporação da Venezuela no Mercosul desencadearam forte conflitos no continente sul-americano, particularmente entre o Paraguai e a Venezuela, mas também no Uruguai e arrastaram o Brasil para o debate. Por outro lado, o ressurgimento da crise econômica na Argentina suscita preocupações. Agita-se a América Latina.

Paraguai e Venezuela partem para a briga

Uma das reações mais fortes ao afastamento relâmpago de 
Fernando Lugo veio da Venezuela. Hugo Chávez ordenou a imediata retirada de seu embaixador em Assunção e a suspensão de envio de petróleo ao Paraguai: "Vamos retirar o envio de petróleo. Não apoiaremos para nada esse golpe. A partir deste instante, ministro (Rafael) Ramirez, que cesse o envio de petróleo a esse país", afirmou Chávez, durante uma cerimônia do dia do Exército venezuelano, dois dias após o golpe. 
A decisão da Venezuela foi efetivamente a primeira sanção comercial – e única – que o Paraguai sofreu, porém, não pouca coisa, uma vez que o país é dependente do petróleo venezuelano. A reposta ao gesto e a veemência da condenação do golpe por parte da Venezuela foi respondida pelo Paraguai com a expulsão do embaixador J
osé Javier Arrúe De Pablo. 
O Paraguai declarou persona non grata o embaixador e acusou Caracas de ingerência em sua política interna. O governo paraguaio divulgou um vídeo entre militares paraguaios e o chanceler venezuelano Nicolás Maduro. De acordo com a ministra de Defesa do Paraguai, María Liz García, Maduro se reuniu com a cúpula militar paraguaia para evitar a destituição do presidente Fernando Lugo. O objetivo de Maduro seria convencer os militares a emitir um comunicado dizendo que, se o Senado derrubasse o presidente, eles continuariam leais a Lugo. O vídeo editado, de um minuto e 50 segundos de duração, inclui fotos e nomes dos participantes. 
O governo venezuelano reagiu às declarações do Paraguai e disse que houve manipulação no vídeo. A rede multiestatal 
TeleSur publicou a íntegra do vídeo usado pelo novo governo do Paraguai. Nas imagens da TeleSur, Maduro não aparece sozinho com os militares, como havia insinuado o material editado e transmitido por uma televisão paraguaia. Ele estava acompanhado de seus pares da Unasul. "Acabaram de dar um golpe e acusam os outros de golpes e contragolpes. Essa acusação não é crível”, disse o chanceler venezuelano.
O Senado paraguaio rechaçou ainda a decisão de integração da Venezuela ao 
Mercosul. Em uma nota, afirmou que a suspensão é "ilegal, ilegítima e violadora do devido processo". Chávez ironizou a decisão e acusou senadores paraguaios de pedir-lhe suborno para permitir o ingresso de seu país no bloco. "São uma verdadeira máfia pedindo dinheiro", disse Chávez sem dar nomes, mas acrescentando haver testemunhas brasileiras e argentinas.
Ressentidos com a suspensão no Mercosul e a entrada da Venezuela à sua revelia, paraguaios estão ameaçando colocar uma pergunta incômoda a Brasil, Argentina e Uruguai: e se o Senado de Assunção decidir agora votar - e rejeitar - a inclusão de Caracas no bloco sul-americano? A iniciativa teria inicialmente apenas efeito político, e não jurídico, mas pode embaralhar as coisas mais à frente.
Segundo Milda Rivarola, da Academia de História de Assunção, a punição imposta ao Paraguai está sendo usada por "setores mais conservadores e nacionalistas" do Congresso como bandeira política. Segundo ele, “é a política externa convertida em política interna para conseguir mobilizar as pessoas, não há visão de Estado”.

Contencioso no Mercosul

Indiretamente o golpe no Paraguai desatou outra crise, dessa vez no Uruguai. A decisão pela entrada da Venezuela no
Mercosul passou a dividir o governo uruguaio. 
Com o afastamento do Paraguai do 
Mercosul, imposta pelos seus pares na organização multilateral como sanção ao golpe, abriu-se a possibilidade de ingresso da Venezuela no bloco econômico. A entrada da Venezuela no Mercosul já tinha sido aprovada há seis anos em uma cúpula presidencial. Aceita nos Congressos da Argentina, Brasil e Uruguai, esbarrava na negativa paraguaia. 
A decisão de aceitar a Venezuela no 
Mercosul foi decidida num encontro em Mendoza, na Argentina, dias após o golpe em reunião pleno do órgão para a qual o Paraguai foi desconvidado. Os três presidentes - Dilma Rousseff, Cristina Kirchner e José Mujica –, após reunião privativa anunciaram a incorporação da Venezuela.
O Brasil, um dos maiores interessados no ingresso da Venezuela no bloco comercial, teria tido um papel ativo no processo. A presidenta Dilma Rousseff mandou buscar o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, no meio da madrugada, em jatinho da FAB, para ajudar a formatar juridicamente a suspensão do Paraguai do Mercosul, uma vez que havia dúvidas jurídicas sobre o processo de exclusão de um país membro e a incorporação de outro.
O protagonismo do Brasil explica-se por seus interesses econômicos com o país comandado por 
Chávez. De acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, as exportações brasileiras para a Venezuela vêm crescendo ano a ano. O Brasil ocupou importantes fatias de mercado antes hegemonizadas apenas pelos Estados Unidos.

Mercosul desata disputa no Uruguai

A decisão, além da contestação do Paraguai que acusa os seus vizinhos de reedição da tríplice aliança, gerou uma crise no Uruguai. O chanceler uruguaio Luis Almagro teria dito que o país não tinha concordado com a entrada da Venezuela "nessas circunstâncias" no 
Mercosul – e sustentou que o ingresso de Caracas no bloco ocorreu após um pedido "decisivo" feito pelo governo brasileiro. O assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, manifestou surpresa com as críticas do chanceler uruguaio: "Ele estava lá e poderia ter sido enfático nisso, ou então se dissociar. O dia que eu quiser me dissociar de uma política da presidenta Dilma, eu pego o chapéu e digo ‘olha, não estou de acordo, vou embora’”.
Ato contínuo, o vice-presidente uruguaio 
Danilo Astori insinou que Mujica adotou uma postura subserviente aos interesses brasileiros. "Esta é a ferida institucional mais grave nos últimos 21 anos do Mercosul", disse o vice-presidente uruguaio.  Mujica desautorizou as afirmações do seu vice e assumiu pessoalmente a decisão de apoio à entrada da Venezuela no Mercosul afirmando que o “fator político venceu o jurídico”.
A raiz das desavenças públicas entre 
Mujica e o seu vice estão relacionadas às divisões internas na Frente Ampla.Mujica e Astori, ambos da Frente Ampla que governa o Uruguai, são de alas diferentes do agrupamento. O presidente é próximo do MPP, formado por ex-guerrilheiros tupamaros, enquanto Astori é ligado ao ex-presidente Tabaré Vásquez, de tendência moderada. Nas últimas eleições presidenciais, Tabaré – que agora anunciou o seu retorno – tentou patrocinar a candidatura de Astori para a sua sucessão, mas Mujica o venceu as prévias internas da Frente Ampla para a definição do candidato. 
Danilo Astori ex- ministro da economia de 
Tabaré Vázques – já foi chamado de "Palocci uruguaio" – nunca escondeu suas críticas ao Mercosul demonstrando preferência por acordos bilaterais com os Estados Unidos. Por outro lado, passados quase dois anos de sua histórica posse, Mujica continua sendo um presidente difícil de digerir para as classes altas uruguaias, que não aceitam sua aversão ao protocolo, sua linguagem popular e estilo de homem do campo. A principal base de apoio do presidente, assegura o analista político Ignácio Zuasnábar continua sendo os estratos mais populares: “Mujica é um fenômeno de representação política dos setores humildes”.
As desavenças em torno do 
Mercosul recolocaram o bloco econômico na agenda de debate e manifestam as diferentes estratégias de países e agentes econômicos. Mesmo no Brasil, os acontecimentos dão conta de que a “direita se assanha contra o Mercosul”. Segundo o jornalista Mauro Santayana, a “FIESP decidiu contratar o ex-embaixador Rubens Barbosa como seu pensador político e porta-voz corporativo. O diplomata, conhecido por sua posição francamente neoliberal, vem combatendo com insistência, a política externa brasileira. Mas, pelo que parece, está prestando mau serviço à indústria de São Paulo, que tem, na Venezuela, um excelente mercado comprador”.
Nos últimos dias, o 
PSDB anunciou que entrará na Justiça brasileira com uma ação contra a decisão do Mercosul de suspender o Paraguai e aceitar a entrada da Venezuela. A iniciativa é do senador Álvaro Dias (PSDB-PR) que andou se encontrando com o presidente Federico Franco empossado após o golpe.

Fonte:  Instituto Humanitas Unisinos – IHU

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